
Vidas suspensas – Omissão do Estado – Dever de decidir – Contagem dos prazos
Vidas suspensas – Dever de decidir.
As vidas suspensas são dos imigrantes em território português que aguardam, na imensidão das horas, por um direito de residir legalmente em Portugal.
Prazo para decidir
Na letra da Lei o prazo seria de 90 dias para receber uma decisão do Estado quanto ao seu pedido de autorização de residência, mas esses 90 dias multiplicam-se por 2 ou 3 anos, ou o tempo de entrar uma alteração legislativa que impeça a omissão do Estado quanto ao seu dever de decidir.
Os prazos administrativos, ou seja, os prazos concedidos ao órgão administrativo para praticar seus atos obedecem as normas do Código do Procedimento Administrativo.
Código do Procedimento Administrativo
O Código do Procedimento Administrativo é extremamente objetivo ao especificar que à contagem dos prazos são aplicáveis as seguintes regras:
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O prazo começa a correr independentemente de quaisquer formalidades;
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Não se inclui na contagem o dia em que ocorra o evento a partir do qual o prazo começa a correr;
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O prazo fixado suspende-se nos sábados, domingos e feriados (contam-se somente os dias úteis);
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Na contagem dos prazos legalmente fixados em mais de seis meses, incluem-se os sábados, domingos e feriados;
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É havido como prazo de um ou dois dias o designado, respetivamente, por 24 ou 48 horas;
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O termo do prazo que coincida com dia em que o serviço perante o qual deva ser praticado o ato não esteja aberto ao público, ou não funcione durante o período normal, transfere-se para o primeiro dia útil seguinte;
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Considera-se que o serviço não está aberto ao público quando for concedida tolerância de ponto, total ou parcial.
São essas as regras que o Artigo. 82º, n.ºs 5 e 6 da Lei n.º 23/2007, de 04 de Julho, que Aprova o regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional – Lei de Estrangeiros, deve observar.
O Artigo 82º, n.ºs 5 e 6 da Lei de Estrangeiros determina que:
Artigo 82.º
Instrução, decisão e notificação
(…)
5 – O pedido de concessão de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 90 dias.
6 – O pedido de renovação de autorização de residência deve ser decidido no prazo de 60 dias.
Assim os pedidos de autorização de residência e renovação de autorização de residência devem ser decididos, respetivamente, no prazo de 90 dias e 60 dias.
Em termos práticos, vamos considerar o pedido de Autorização de residência para exercício de actividade profissional subordinada (Artigo. 88º da Lei de Estrangeiros) para entender a contagem dos prazos da AIMA para decidir.
A grande questão é saber quando inicia essa contagem. E a resposta é muito simples: o prazo tem início no dia a seguir ao da apresentação da Manifestação de Interesse em obter a autorização de residência. É esse o ato que dá início a contagem do prazo para que o Estado decida.
O problema em desrespeitar largamente esses prazos é que o Estado português ao fazê-lo viola direitos de índole pessoal, “que serão reconduzíveis à tipologia de direitos, liberdades e garantias, quer como direitos económicos, sociais e culturais, como o direito ao trabalho ou à saúde, que são direitos fundamentais não integrados pela Constituição naquela primeira categoria, mas que quando coartados na sua dimensão mais essencial, ligada ao princípio da dignidade da pessoa humana e à própria liberdade individual – como ocorre no caso ora em apreço – terão de ficar abrangidos pelo regime aplicável àqueles direitos, liberdades e garantias e logicamente pelo âmbito desta intimação.”
A violação praticada pelo Estado português ao deixar de decidir um pedido de autorização de residência equivale a violar direitos fundamentais do requerente.
Os direitos fundamentais “são as posições jurídicas básicas reconhecidas pelo direito português, europeu e internacional com vista à defesa dos valores e interesses mais relevantes que assistem às pessoas singulares e coletivas em Portugal, independentemente da nacionalidade que tenham (ou até, no caso dos apátridas, de não terem qualquer nacionalidade).
O Estado tem a obrigação respeitar os direitos fundamentais e de tomar medidas para os concretizar, quer através de leis, quer nos domínios administrativo e judicial.” (https://diariodarepublica.pt/dr/lexionario/termo/direitos-fundamentais )
Em resumo, tem o Estado português o dever de decidir os pedidos de autorização de residência e renovação de autorização de residência, respetivamente, no prazo de 90 dias e 60 dias, sob pena de violação aos direitos fundamentais (residir, cuidados médicos, livre circulação) dos imigrantes.
Para a defesa de um direito é indispensável conhecê-lo. Essa é a minha missão: divulgar, de forma clara, o direito.
TC – Consultoria em Direito Internacional e Migratório.
- Posted by Raquel Trindade da Costa
- On 17 de fevereiro de 2024
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